Sábado de sol no InvestCamp 2

(publicado originalmente em http://blogdodaniel.xpg.uol.com.br/0034.html)

Boa noite, pessoal.

No último fim de semana estive em São Paulo para participar do InvestCamp 2. O InvestCamp é um evento anual promovido para desmitificar investimentos em geral focado em leigos e iniciantes.

O evento foi realizado no último sábado e contou com presença de centenas de pessoas. Considero que a participação foi muito proveitosa especialmente para entender o que está se passando pelas cabeças das pessoas.

Um dos aspectos que me chamou atenção foi que mais de 90% do público estava mais interessado em discutir estratégias em ações do que discutir investimentos em geral. A princípio, nada teria de alarmante se não estivéssemos em um fórum onde encontramos pessoas que “investem” em títulos de capitalização, por exemplo. Para agravar, poucas dentre as pessoas lá presentes que investem ou pretendem investir em ações tinham como foco ser sócio da empresa da qual pretendia comprar ações. Ou seja, o foco de investimento no mercado de ações para essas pessoas era meramente especulativo.

Ficou ainda mais claro para mim que o apelo comercial de mercado em investimentos em ações não tem qualquer conexão com um plano estratégico de investimentos de longo prazo: a maioria dos presentes eram meros especuladores. E combinando pouco conhecimento, pouco acesso à informação (raramente se consegue boa informação sem atraso significativo) e muita ganância, a maioria está perdendo dinheiro. Para nossa sorte, os kamikazes eram em sua maioria jovens, bem qualificados, e terão tempo de aprender com os erros e recomeçar de uma forma lucrativa de investir.

Algumas pessoas pareciam até se esquecer de que investir em ações significa comprar parte em uma empresa. Não demonstravam preocupação com o que a empresa produz, como está inserida no cenário macroeconômico, qual o perfil do endividamento, quais as perspectivas futuras, enfim, o que é a empresa. Estavam interessados em saber apenas o comportamento gráfico anterior de determinado ticker (código com o qual os ativos são identificados na Bovespa) para tentar prever o comportamento futuro do ativo. Para essas operações astrológicas, tinham teorias naturalistas, estatísticas, etc. as mais diversas. E todas com altíssima audiência.

Acredito, no entanto, que este comportamento especulativo só seja transformado em investimento quando houver intervenção governamental. Do jeito que funciona hoje, está bom para BMF&Bovespa (aumenta o número de operações e consequentemente a arrecadação de taxas), para as corretoras (mais corretagens) e para os grandes investidores (que são os verdadeiros ganhadores desta especulação toda). Só para o pequeno e inocente – burro, talvez – investidor é que a coisa não esteja tão boa, mas ele não consegue perceber isso com facilidade.

Uma forma de coibir a especulação seria aumentar a taxação das operações de curto prazo, reduzindo os tributos para operações de longo período. Hoje, temos apenas 2 grupos: day trade(operações de compra e venda no mesmo dia) taxados em 20% e normais taxadas em 15%. Se jogasse a tributação de day trade para, digamos, 50%, aplicássemos tabela regressiva de IOF como acontece para os investimentos de renda fixa, e reduzíssemos a tributação para investimentos de mais longa duração (por exemplo, redução para 5% sobre o lucro para operações com duração superior a um ano), haveria um movimento natural de maior interesse em investir ao invés de especular.

Também está evidente que as pessoas desconhecem a maioria das alternativas em investimento. Alguns já até ouviram falar de algumas coisas, mas ainda assim a quantidade de informações distorcidas é enorme. Muitos já ouviram falar sobre títulos públicos, mas não sabem diferença entre as modalidades. Foi possível encontrar gente que “entendia” de título público, mas não sabia que eram utilizados para financiar a dívida pública (e olha que a palavra “público” está no nome do investimento).

Agora, o alerta mais crítico que o InvestCamp 2 me apresentou foi o incrível grau de falta de educação financeira das pessoas, ainda que interessadas em investir com qualidade! Tinha gente que coloca dinheiro na poupança e eventualmente entra no cheque especial (e não cobre com o investimento da poupança). O sujeito nunca tinha parado para analisar que um dia descoberto no cheque especial come o rendimento da caderneta de poupança de quase 1 mês, considerando também as taxas.

Em razão desta participação, decidi que não vou me limitar a falar de investimentos aqui. Vou tomar alguns dias para explicar como funcionam juros compostos, por exemplo. Vou ter que abrir espaço para educação financeira, pois percebi que é o que está mais urgente para nosso povo.

Estou considerando também começar a visitar escolas, empresas e outros ambientes para começar a levar estes conceitos a mais interessados, mas preciso refletir mais a respeito, especialmente como operacionalizar isso. Tenho como verdade para mim que nunca seremos um país desenvolvido enquanto as pessoas não souberem pelo menos equilibrar seus orçamentos familiares.

Por fim, parabéns aos organizadores do evento: Link Trade (www.linktrade.com.br), Dinheirama (www.dinheirama.com.br), Meu Milhão (www.meumilhao.com.br), e Pólvora. Se possível, aumentem a frequência e levem a outras cidades. Eventos como este são extremamente necessários e escassos.

Abraços, boa terça-feira a todos.

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